10.10.07

Cada um com Seu Cinema


Cannes celebrou seus 60 anos com um filme de episódios produzido pelo presidente do festival, Gilles Jacob, tendo por tema a sala de cinema. Dedicado a Fellini, "Chacun Son Cinéma" reúniu 33 curtas de três minutos. O tom dominante é a nostalgia frente ao espetáculo cinematográfico. O resultado é envolvente, com apenas três episódios constrangedores (Chahine, Cimino e Gitai). Para equilibrar, também três curtas pairam acima da média.

Walter Salles assina um dos momentos mais certeiros. Seu episódio, "A 8.944 km de Cannes", registra em plano único, defronte a uma sala popular em Miguel Pereira (RJ), um desafio repentista sobre o festival entre Castanha e Caju. Tem bossa, inteligência e ironia.

Batizado de "Três Minutos", o grego Theo Angelopoulos restabelece um diálogo, em chave fantasmagórica, entre Jeanne Moreau e Marcelo Mastroianni. Ela, no presente, repete um monólogo sobre a relação deles extraído de "A Noite" (1961), de Antonioni. Ele, no passado, surge numa cena de "O Apicultor" (1986), do próprio Angelopoulos. Sublime.

Outro diálogo fílmico, entre "A Paixão de Joana D'Arc" (1928), de Dreyer, e "Viver a Vida" (1962), de Godard, está ao centro de "Duas Vezes Artaud" de Atom Egoyan. Contrapõem-se a grande tela de ontem e as pequenas telas dos celulares. De todos, o episódio mais contemporâneo e investigativo.

Os demais curtas se dividem em sete grandes grupos. O principal, com seis episódios, reúne pequenos filmes sobre a memória e a decadência das salas (Cronenberg, Hou Hsiao-Hsien, Konchalovsky, Loach, Moretti, Tsai Ming-Liang). Cinco curtas saúdam o cinema como catalisador amoroso (August, Kiarostami, Lelouch, Van Sant, Wong Kar-wai). Quatro episódios (Depardon, Kaurismaki, Wenders, Yimou) celebram a resistência do cinema em salas improvisadas. A cegueira como metáfora marca os curtas de Chen Kaige, Inãrritu e Ruiz. Dois filmes (Assayas e Dardenne) partem de furtos de bolsa para paradoxalmente discutir relações. O ódio aos críticos irmana os curtas de Youssef Chahine e Lars von Trier.

Por fim, a idéia do filme-gag aproxima as propostas de Jane Campion (em chave onírico-feminista), Joel e Ethan Coen, Takeshi Kitano, Manoel de Oliveira (o único distante do tema da encomenda), Roman Polanski e Elia Suleiman. Contas feitas, "Chacun" supera as expectativas e transcende a efeméride. Ponto para Jacob.

Spoiler Rating: 65
LBC Rating: ~

Por Amir Labaki - Valor Econômico

Nenhum comentário:

by TemplatesForYou
SoSuechtig,Burajiru