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8.1.08

Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças

Arrasado ao descobrir que sua namorada, Clementine, pagou a um médico para eliminá-lo das suas lembranças, Joel decide fazer o mesmo. Deitado em sua cama e inconsciente enquanto um técnico localiza suas memórias de Clementine e as apaga, Joel, porém, responde mal ao tratamento. Enquanto cada experiência que passou com a namorada ressurge e é brevemente revivida, há alguma parte dele que permanece alerta e se dá conta de que ele não vai se livrar apenas daquilo que lhe causa dor: os bons momentos estão escoando pelo ralo junto com os momentos ruins - e até esses, afinal, ele gostaria de preservar.

Em seu desespero, Joel tenta esconder Clementine em partes do seu cérebro que o técnico não mapeou. Ele a leva para as humilhações da adolescência e para as confusões da infância, correndo com Clementine por entre o labirinto daquilo que ele foi antes de conhecê-la, com o técnico sempre em seu encalço. Quanto mais imaterial a namorada se torna, maior sua certeza de que ele está cometendo um erro terrível: com ou sem Clementine ao seu lado, Joel precisa que ela exista. BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS tem as marcas de seu roteirista, o Charlie Kaufman de QUERO SER JOHN MALKOVICH, ADAPTAÇÃO e CONFISSÕES DE UMA MENTE PERIGOSA - um protagonista perdido no interior de sua própria cabeça, a ausência de delimitações entre o real e o surreal e, principalmente, o descaso pelas regras comumente aceitas sobre as complicações que a platéia é capaz de acompanhar.

Complicações não faltam em BRILHO ETERNO, mas a clareza com que Kaufman navega entre elas é testemunho da qualidade de sua escrita. Graças a ela, ao seu senso de humor e às ótimas interpretações de Jim Carrey e Kate Winslet, como o derrotista Joel e a impulsiva Clementine, o filme consegue apelar ao mesmo tempo à inteligência e aos sentimentos, e ser simultaneamente ficção científica e romance. Quanto mais Kaufman avança em seu trabalho, porém, mais seus quebra-cabeças deixam de parecer brincadeiras, e mais se constituem em buscas. Na história deslavadamente romântica que é o pretexto de BRILHO ETERNO, Joel atravessa toda uma vida de memórias para proteger Clementine da erradicação e ser capaz de se lembrar, ao acordar, de que a amou - e que a amaria de novo. No desenrolar lógico do roteiro, porém, o que de mais importante Joel encontra é a si mesmo, nas mais diferentes versões (e nos lugares e situações mais improváveis, graças ao talento do diretor Michel Gondry para traduzir visualmente os cenários criados pelo roteirista nessa viagem pela memória). Ser, portanto, é lembrar.

Não é difícil enxergar em BRILHO ETERNO uma espécie de manifesto a favor da autodescoberta tortuosa e dolorosa da psicanálise, e contra a felicidade química amplamente acessível das drogas da geração Prozac. Tirar o fio aos sentimentos e anestesiá-los, defende Kaufman, é tirar também da mente algo de sua capacidade de criar. Não por acaso, o roteirista foi buscar o título de seu filme no poema Eloisa to Abelard, do inglês Alexander Pope (1688-1744) - mais especificamente da parte em que Heloísa, lamentando o fim trágico de seu romance com Abelardo, diz que, antes que a alma de um amante recupere sua paz, ela terá de amar, odiar, ressentir-se, arrepender-se e dissimular. Tudo, diz Heloísa, menos esquecer. Joel e Kaufman, com certeza, concordam com ela

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