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Não há uma pessoa no mundo que não conheça o conto de Cinderela ou uma de suas diversas interpretações. Inspirado na versão de Charles Perraut, o filme Disney conta a história da menina que fica sobre os cuidados de sua cruel madrasta após a morte de seu pai. Atormentada por suas feias e invejosas meias-irmãs, Cinderela é obrigada a trabalhar como criada em sua própria casa. Ainda assim, a garota cresce cada vez mais bonita e nunca perde a esperança de que um dia as coisas possam melhorar. Esse dia chega quando o Rei convoca todas as jovens solteiras do reino para um baile em homenagem ao Príncipe, e todos sabemos para onde a história irá a partir desse ponto.
CINDERELA foi produzido em uma época problemática para os estúdios Disney, e isso significava que Walt não poderia ousar em caros experimentos como havia feito com seus primeiros longas-metragens. Essa implicação é refletida na tela, pois os visuais de CINDERELA são muito mais simples do que os vistos em PINÓQUIO e BAMBI (a não ser pelos imaginativos cenários inspirados pela diretora de arte Mary Blair) e a animação dos personagens é mais presa às limitações das referências com atores reais. Deste modo, o filme se sustenta na força de sua história e no charme de seus personagens, e são estes os fatores chave para o seu sucesso. CINDERELA é a clássica história da menina em apuros, e o que faz a mesma funcionar é o fato de podermos nos identificar com o sofrimento da personagem. Quando Cinderela tem seu vestido rasgado e é deixada para trás, nos sentimos mal ao vermos todos os sonhos da jovem serem jogados fora, mas ao mesmo tempo sentimos uma grande satisfação quando ela finalmente sucede sobre suas adversárias ao final.
Walt Disney já foi alvo de muitas feministas por suas heroínas passivas e complacentes, mas a verdade é que Cinderela é uma personagem muito mais forte do que Branca de Neve, e pode ser considerada uma antecessora das atuais heroínas independentes como Bela e Pocahontas. Apesar de ser bondosa e sonhadora, Cinderela não se deixa subestimar por sua madrasta e meias-irmãs, e até mesmo possuiu uma ponta de ironia em algumas de suas falas (“Talvez deva interromper a... lição de música”). Quando fica sabendo sobre o baile, por exemplo, ela assume sua posição como parte da família e lembra que o convite também se estende a ela. Um dos ingredientes principais para o sucesso da personagem é a voz de Ilene Woods, que possui uma qualidade de princesa de contos-de-fada, mas também uma autoconfidência e segurança que a torna uma heroína contemporânea.
Mas o que torna Cinderela uma heroína ainda mais forte é a presença de uma perversa vilã. A Sra. Tremaine não é apenas uma das mais assustadoras vilãs dos estúdios Disney, mas também uma das mais reais. Não sendo provida de nenhuma espécie de poder mágico, a Madrasta é uma pessoa fria e calculista que faz todo o trabalho sujo com suas próprias mãos, não tendo medo de mostrar suas verdadeiras cores na frente dos outros personagens e não medindo esforços para fazer a vida de Cinderela miserável. Sua introdução é uma das mais interessantes de qualquer personagem Disney, sendo apresentada em meio às sombras apenas com seus olhos em realce. A vilã ainda proporciona alguns dos melhores momentos de atuação no filme, graças à poderosa animação de Frank Thomas e a ríspida e elegante voz da atriz Eleanor Audley. O espectador pode sentir em sua dominadora expressão o ódio que sente por Cinderela, e seus brilhantes diálogos alternam entre linhas calmas e frias e momentos de súbita fúria.
Assim como em BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES, apenas a história de Cinderela não seria o bastante para carregar um longa-metragem inteiro, então aqui temos a introdução de uma galeria de animais que fazem companhia para a personagem-título. O subpiloto dos ratinhos Jaque e Tatá e sua rivalidade com o gato Lúcifer é perfeitamente inserido na história principal – ao final, Cinderela apenas sucede porque os ratinhos também sucedem sobre seu adversário. O grande destaque dado aos personagens cômicos, fazem de CINDERELA um filme mais leve e menos sombrio que BRANCA DE NEVE e A BELA ADORMECIDA, mas há alguns momentos brilhantemente dirigidos que merecem destaque. Um deles é a cena em que as meias-irmãs rasgam o vestido de Cinderela, momento de pânico interpretado com o uso de uma edição rápida e um dramático uso de cores. Outro é a quando os ratinhos devem percorrer a longa escadaria a fim de levarem a chave para Cinderela a tempo, em uma cena com suspense digno de um filme de Alfred Hitchcock.
Apesar de não ter a ambição de FANTASIA ou PINÓQUIO, CINDERELA é um dos filmes mais satisfatórios emocionalmente produzidos por Walt Disney, e isso é o que o faz permanecer uma das mais memoráveis obras do estúdio. Ainda que não esteja exatamente no mesmo patamar dos filmes já citados, CINDERELA não perdeu nem um pouco de seu charme mais de cinqüenta anos após seu lançamento.
Spoiler Rating: 83
LBC Rating: ~
Por Lóiam Torres (Animatoons), Marc Eliot (O Príncipe Sombrio de Hollywood) & Diana e Mário Corso (Fadas no Divã)
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