10.8.07

Sonhos Expressionistas

Com a aproximação do fim do ano de 1940, FANTASIA, a meditação gótica de Walt, banhada em pesada música clássica e impregnada de sombrias visões de medo, solidão, contrição e tristeza, estreou em todo o país. Embora ninguém pudesse adivinhar à época, FANTASIA acabaria sendo a pira fúnebre dos sonhos de Disney, de cujas ruínas em cinzas emergiria o pavoroso pesadelo de uma terrível vingança.

FANTASIA era, essencialmente, um exercício intelectual. Como tal ficou sobrecarregado de autoconsciência. Sem uma estrutura de formato reconhecível, ou a ancora de uma narrativa linear, o filme revelou-se falso, deixando a maioria do publico confusa na época. Desde a abertura, com seqüências ao vivo, apresentando o crítico musical Deems Taylor como narrador, trajando fraque negro, e com os malabarismos visuais, tentando se passar como sofisticação cultural, o filme desenrolou uma serie de vinhetas confusas.

No seu “primeiro movimento” puramente expressionista, abstrações visuais ilustravam os sons de uma musica discordante. A isso se segue a esquisitice muda do “Aprendiz de Feiticeiro”, durante o qual um Mickey Mouse silencioso seve a um mago parecido com Merlin. Em seguida , assistiu excertos do Suíte Quebra Nozes, A Sagração da Primavera, e Sinfonia Pastoral, visualizados com grandiosidade que obscurece os poucos e maravilhosos momentos de diversão leve e suave.

Na penúltima seqüência de FANTASIA, “A Night in the Bald Mountain”, Disney inesperada e surpreendentemente mudou o humor do filme ao tentar visualizar o “Deus do Mal e da Morte”, com o personagem Chernobog, semelhante a um gárgula. A esse se segue “Ave Maria”, o “movimento” final do filme, no qual uma procissão à luz de velas dos que adoravam o Deus da Luz celebra o amanhecer.

O filme consiste basicamente de oito segmentos animados, acompanhados da melhor música clássica de grandes mestres. O maestro Leopold Stokowski ficou a cargo de reger a Orquestra da Filadélfia:

Toccata And Fugue In D Minor
A abertura do programa fica por conta do segmento "Toccata And Fugue In D Minor" do compositor Johann Sebastian Bach. Pela primeira vez, Disney e seus artistas se arriscaram no mundo da abstração, produzindo um grande segmento onde a equipe de efeitos especiais teve a chance de colocar todo o seu talento a vista na tela. Ainda que não tem a mesma carga de entretenimento dos próximos desenhos, "Toccata" pode ser considerado a seqüência mais ousada de todo o filme. De fato, provavelmente nunca vimos ou veremos outra obra como esta em animação. Ainda temos um bom modo de dar a tonalidade ao filme, com metade do segmento sendo composto de cenas de Stokowski e a orquestra.

O Suíte Quebra-Nozes
O próximo segmento se trata do famoso balé "The Nutcracker Suite" de Tchaikovsky. Disney e seus artistas tomaram um caminho diferente da tradicional estória envolvendo brinquedos, fazendo uma própria interpretação da música. O que veremos na tela é um número que simboliza as estações do ano através de fadas aladas e outros elementos da natureza, como flores e peixes bailarinos, cogumelos chineses e ainda cravos russos. O diretor Samuel Armstrong faz um competente trabalho interligando todas as partes individuais do balé em apenas uma peça, com cada uma delas simbolizando uma estação do ano.

O Aprendiz de Feiticeiro
"O Aprendiz de Feiticeiro" de Paul Dukas é o terceiro número e talvez o menos ambicioso de "Fantasia", o que não o torna diminutivo diante dos outros segmentos. A verdade é que "O Aprendiz" é a mais famosa e querida das peças entre o público, sendo que foi o pontapé inicial para a produção de todo o resto do filme. Este é um dos únicos segmentos que retrata exatamente a história idealizada pelo compositor ao escrever a música, e neste caso vemos Mickey no papel do feiticeiro afobado que quer aprender seu ofício antes da hora. Ele rouba o chapéu mágico de seu mestre e dá vida à um bando de vassouras para encher o caldeirão de água no seu lugar. Como resultado de sua teimosia, o camundongo cria algo que nem ele mesmo sabe controlar. Fred Moore é o diretor de animação do Mickey neste segmento e foi o principal responsável pela renovação do design do personagem vista aqui. Ele ganhou olhos muito mais expressivos e um corpo com formas mais flexíveis e ainda, de certa forma, críveis.

A Sagração da Primavera
Dos músicos cujas composições foram usadas em "Fantasia", o único vivo na época era Igor Stravinsky, cuja criação "The Rite of Spring" é vista na tela como uma explicação científica da evolução da vida na Terra, desde os primeiros seres microscópicos aos gigantes dinossauros. Stravinsky, que na época disse que a interpretação de Disney era exatamente o que ele havia imaginado, anos depois declarou um certo descontentamento com o desenho, mas isso provavelmente se deve às alterações feitas na música sem sua permissão.

Sinfonia Pastoral
Abrimos o segundo ato do programa com sexta composição de Bethoven, "The Pastoral Simphony", que rendeu provavelmente o segmento mais gracioso da fita. Com seu cenário mitológico, o Monte Olimpo, o elenco de personagens é composto de figuras tão fantasiosas quanto cavalos alados que cortam o céu, sátiros que saltam pelos campos, cupidos e ainda centauros e suas namoradas centaurettes. Curiosamente, a música originalmente escolhida para a peça era "Cydalise" de Pyerné, mas Walt resolveu mudar para Bethoven quando sentiu que esta não fornecia o suporte suficiente para desenvolver a história.

A Dança das Horas
"Dance of the Hours" de Ponchielli entra em cena no momento propício, principalmente para agradar aqueles que estavam achando o filme dramático demais. Uma sátira ao balé clássico que representa as horas do dia por um grupo de animais: Avestruzes, hipopótamos, elefantes e jacarés.

Night on Bald Montain & Ave Maria
O grande final de "Fantasia" vem na forma da união de duas peças que completam uma a outra. A primeira é "Night on Bald Mountain" de Modeste Mussorgsky, ilustrada pelo demônio Chernobog que vive no alto da montanha, e na noite de Hallowen vem atormentar as almas do vilarejo. Este poderoso desenho se afirma ainda nos dias de hoje como o mais sinistro e adulto já produzido pelo estúdio, algo que dificilmente seria aceito pelos executivos nos dias de hoje, devido aos padrões do 'politicamente correto'. A maravilhosa animação de Chernobog por Vladimir Tytla ajuda ainda mais a complementar a apresentação. Interligado como "Bald Mountain", vem a belíssima e mundialmente famosa "Ave Maria" de Franz Schubert, que fecha o filme. Talvez o mais simples dos segmentos - uma procissão religiosa que segue até uma capela gótica - e ainda um dos mais complexos, com os intrincados design de Kay Nielsen e um dos mais extensivos usos da câmera multiplanos.

Spoiler Rating: 88
LBC Rating: ~

Por Matheus Mocelin Carvalho (Animatoons) & Marc Eliot (O Príncipe Sómbrio de Hollywood)

Nenhum comentário:

by TemplatesForYou
SoSuechtig,Burajiru