I´M NOT THERE é um projeto cercado de grande expectativa, tanto pelo gigantismo de seu tema (uma cinebiografia de Bob Dylan) quanto pela originalidade da proposta (seis atores interpretam fases e aspectos diferentes da vida do cantor e compositor). E o resultado mostra que a proposta não era puro exibicionismo, e sim a evolução natural de um cinema que procura comungar pesquisa de linguagem e um certo grau de comunicação, que não encerre o filme em um nicho fechado.
Todd Haynes conseguiu, enfim, o que vinha buscando desde o começo de sua carreira: captar o fluxo da vida e as metamorfoses que sofremos fugindo dos elementos que costumam servir de leito para a narrativa convencional (a trajetória do herói, os "três atos" do roteiro, e, principalmente, as “causas” que determinam o destino dos personagens). O objeto do filme é perfeito para isso: Bob Dylan é, ao mesmo tempo, um artista em eterna transformação e um homem coerente com alguns princípios básicos.
E o filme reproduz essa idéia dentro de sua própria estrutura, de forma muito bem-sucedida. Épico, musical, drama intimista, faroeste, "road movie", comédia _o filme se transforma na medida em que seu personagem "pede". E Haynes faz o pequeno milagre de conferir uma estranha organicidade a tudo isso.
Os atores ajudam. Eles vivem personagens com nomes diferentes mas que, fica muito evidente, representam facetas ou fases de um mesmo homem, Bob Dylan. Do menino negro Marcus Carl Franklin, que faz o pequeno Dylan, fugitivo e já apaixonado por determinados aspectos da música tradicional americana, a Cate Blanchett, que incorpora Dylan na fase mais conturbada de sua carreira, quando ele incorporou uma banda de rock e foi considerado um traidor do folk e da canção de protesto.
Funciona legal, depois que você se acostuma. A trilha é toda de Dylan, lui-même.
Como o filme explode em várias direções, inclusive com material de arquivo, de época, sobre a história e a política dos anos 60, parece que falta síntese e firmeza no bisturi na hora de concluir. Fica girando um pouco em falso, indo e vindo. Mas ficam os momentos de brilho e a visão nada careta de um grande artista.
Spoiler Rating: 87
LBC Rating: ~
Por Luiz Zanin Oricchio (Estado) e Pedro Butcher (Folha)
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